quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Crônicas de Zan: Os três reis deuses



As Crônicas de Zan são uma coleção de contos e trechos de meus livros, que tenho o imenso prazer em poder compartilhar com vocês.

Sobre o conto: Meu primeiro conto aqui no Literatura Fantástica Brasil: Os três reis deuses. É um epílogo do meu primeiro livro (ainda escrevendo): "A Filha do Tempo". Conta a história de um encontro entre os três reis deuses dos grandes reinos do Império Ômega, do mundo de Ethérion Zeus, Odin e Hórus:



 

Era uma noite quente, muito quente. Uma brisa refrescante soprava as vezes, fazendo as folhas das arvores dançarem. O casal seguia tranquilamente pela avenida, de mãos dadas, mas sem emitir nenhum som.

Ninguém prestava atenção aos dois, afinal, todos têm uma vida bem puxada. Por que parar para ver um casal andando? Porém, se alguém prestasse um pouco de atenção, verá que nenhum dos dois encostava a palma dos pés no chão... pisavam alguns centímetros acima do solo.

Ele estava vestido formalmente: terno azul marinho, camisa de seda branca e sapatos e cinto pretos. Só para não deixar de lado seu símbolo de poder, sua gravata era azul, cheia de pequenos raios amarelos.

Sua esposa estava lindamente deslumbrante, como sempre. Vestia um vestido azul marinho, combinando com o terno do marido. Tinha uma linda tiara de brilhantes na cabeça, que combinava com seus braceletes. Tinha um colar lindo, com um pequeno raio dourado como pingente.

- Querido - disse ela - porque escolheu justo esta cidade, neste país?

- Ora meu amor, aqui é uma região nula. As divindades daqui nunca tomaram partido em nenhuma batalha. Permitem que qualquer ser dos três grandes reinos entre tranquilamente.

- Entendi - disse a esposa. Que melhor lugar para uma reunião entre os líderes, que o lugar onde não podem tentar se destruir? Muito bem pensado. Não é a toa que é o Senhor do conselho.

- Sim, mas não diga isso perto dos nossos convidados, certo? - disse o marido, tentando esconder o orgulho que a posição lhe trazia.

Andaram por cerca de vinte minutos, até chegar a uma pequena praça. O lugar não tinha nada demais. Apenas mais uma das muitas praças iguais deste país. Alguns brinquedos de madeira para as crianças se divertirem. As arvores frutíferas estavam bem carregadas, prontas para qualquer pessoa experimentá-las.

No meio da praça havia um conjunto de bancos de cimento disposto em círculo. Eram seis bancos, que acomodariam perfeitamente os membros da reunião. Em um dos bancos, estava um homem, aparentando seus cinqüenta anos. Era forte, musculoso e irradiava poder. Vestia um terno cinza muito bonito. Os cabelos brancos, muito bem penteados, balançavam junto com a brisa. A barba recém aparada, já grisalha, dava-lhe uma certa autoridade. A única coisa estranha nele era um tapa olho preto que cobria-lhe o olho esquerdo.

Quando os viu (ou sentiu), levantou-se e fez uma grande mesura.

- Senhor Zeus - disse o homem.

Zeus e sua esposa curvaram-se em sinal de respeito. O homem olhou para a mulher, tomou sua mão direita entre as suas e beijou-a.

- Senhora Hera, formosa como sempre.

- Ora Senhor Odin - disse Hera - muito obrigada por seu cavalheirismo.

- Permita-me pergunta-lhe, senhor Zeus. Deveria ter trazido Frigg?
- Não. Minha esposa apenas me fazia companhia durante a viagem. Certo querida?

- Exatamente meu amor. Meu senhor Odin, perdoe-me se minha presença o perturba.

- De maneira alguma, senhora.

Suas palavras eram gentis, mas seu tom e seu olhar mostravam exatamente o que pensava em sua mente. Já não bastasse ter que se encontrar com Zeus, ainda tinha que aturar sua esposa. Hera bem sabia que os nórdicos eram machistas. Afinal, seu conselho era formado apenas por deuses do sexo masculino.

- Bem - disse Hera - já é hora de ir.

- Cuide-se meu bem - disse Zeus, beijando-a. Odin fez uma profunda mesura.

- Até mais senhores - disse Hera. Virou-se e caminhou dez passos antes de simplesmente desaparecer.

Como se estivesse esperando a saída de Hera, o último participante da reunião chegou, de uma maneira digamos, escandalosa. Ele veio como um falcão, que transformou-se em luz acima dos dois homens e desceu ao lado deles.

"Pelo conselho primordial - pensou Zeus - esse cara nunca vai crescer?"
- Olá senhores - bradou o terceiro homem, fazendo uma profunda mesura para eles, a qual foi imitada por Zeus e Odin.

- Hórus, a quanto tempo - disse Zeus.

- Sim, sim. Bem, se não se importam, vamos direto ao assunto.

- Concordo - bradou Odin - Tenho mais o que fazer em Asgard.

Zeus estudou seus companheiros. As coisas não poderiam ter começado "mais amistosas". Com um profundo suspiro, caminhou até um dos bancos e sentou-se. Odin e Hórus sentaram-se de frente para ele.

- Bem senhores, comecemos então nossa reunião. Primeiramente, como é nosso costume desde a primeira guerra, façamos nosso juramento.

Hórus parecia animado por Zeus começar direto no ponto, assim, poderia voltar para suas festas mais rapidamente. Odin apenas revirou o olho, como que diz "tanto faz, ande logo".

Zeus levou o punho fechado a frente, sendo imitado pelos dois. Quando seus punhos se tocaram, houve trovões e relampagos. Os três deuses bradaram em uníssono.

- Juramos, pela Ordem, começo de toda a criação do mundo, continuar mantendo a paz e a comunhão entre os reinos divinos.

Mais trovões e relâmpagos, então parou.

- Vamos então, ao assunto de nossa reunião - disse Zeus. Não sabia qual seria a reação dos dois deuses, mas era parte de seu dever como Senhor do Olimpo relatar aos Senhores de Asgard e Duat um problema de tamanha gravidade.

- Diga-nos então o que aconteceu que o assustou tanto, poderoso Zeus - resmungou Odin.

- Não os teria chamado se não fosse algo tão sério. A barreira do Caos está perdendo o poder.

- O que? - disse Hórus - Isso é impossível. Foi o próprio conselho primordial que construiu a barreira, com o corpo do próprio Caos!

- Eu sei Hórus. Mas estive verificando pessoalmente, junto com meus irmãos. É a mais pura verdade.

- Então, - disse Odin - é isso. Agora faz sentido.

- O que é isso? O que faz sentido? - perguntou Zeus.

- O motivo dos Iotuns estarem atacando mais freqüentemente Asgard. O Caos e a destruição estão crescendo, certo?

- Infelizmente, tenho que dizer que sim Odin.

- Espere - disse Hórus - muita calma nessa hora. Está me dizendo que o Caos está crescendo novamente...

- Sim - disse Zeus.

- ... o mesmo Caos que quase aniquilou toda a vida na terra? Mas como? O que está alimentando seu poder?

- Isso eu também gostaria de saber - disse Odin.

Chegou então, a parte mais complicada. Será que aceitariam sua explicação? Será que achariam que ele estava mentindo, tentando trair a união?

- Reuni todos os súditos do Olimpo à uma semana. Unimos nosso poder para restaurar todas as fissuras da barreira. Funcionou, por enquanto. Porém, enquanto restaurávamos a barreira, por entre uma das brechas, saíram criaturas que eu nunca tinha visto. Não eram Gregas, Egípcias nem Nórdicas. Nem de outro reino divino da Terra. Não pertenciam a este mundo.

O silêncio que pairou sobre o lugar foi desconfortante, sombrio e perigoso.

- Como eram as criaturas? - perguntou Hórus.

- Tinham quatro braços. Eram vermelhas, vestidas de armadura. Em duas mãos, as de cima,  carregavam espadas. As duas de baixo lançavam lava... do Caos. Possuiam duas cabeças, com quatro olhos cada, dois em cima e dois em baixo.

- Por Asgard, Zeus. Acha mesmo que acreditaremos nisso?
- É a mais pura verdade Odin. Acha que eu brincaria com uma coisa dessas?

- Brincar? Você? Impossível. Vocês, gregos, não têm o mínimo de senso de humor. Muito menos vocês, Nórdicos.

- Hora moleque - bradou Odin - Quer experimentar meu cajado?

- Demorou vovô! Vamos ver se ainda consegue fazer alguma coisa, velhote.

- PAREM!

Os dois olharam para Zeus, que já tinha seus raios apontados para eles. Relutantemente (e sobre a pressão de ser atingido por um bom raio na cara), eles pararam.
- O que é isso, Zeus? - perguntou Odin, muito calma e perigosamente.

À um triz do começo da segunda grande guerra, Zeus falou o mais calmo que poderia.

- Odin, Hórus... eu posso provar o que eu disse, se me derem uma chance apenas.

Os dois deuses se olharam por um tempo. Sentaram-se. Zeus fez sumir seus raios. Olharam para Zeus e acenaram a cabeça.

- Apenas uma chance, olimpiano - disse Odin. Hórus olhava atentamente para Zeus e depois para Odin. Ele estava pronto para matar o primeiro que mostrasse fraqueza. Os egípcios respeitavam poder e força. Os Nórdicos não ficavam atrás. Zeus só era o líder do conselho por ser o mais forte. Nem tão velho como Odin e nem tão novo como Hórus. Isso porém, não os fazia menos poderosos, senhores de impérios.

Zeus colocou a mão na mente e disse.

- Irmãos, tragam-no.

- Como ousa chamar seus irmãos aqui, na reunião? – gritou Odin. Uma reunião do conselho dos reis não podia ter nenhum ser da comitiva real que não fosse o próprio rei. Salvo, as vezes, as esposas.

- Por favor Odin – disse Zeus – não tire decisões precipitadas. A comitiva de vocês está a postos, assim como a minha. Esperem e vejam, depois, se assim desejarem, poderemos lutar até nos destruir.

- Lutar é bom – disse Hórus – Destruir vocês ainda melhor. Mas verei o que é tão importante para fazer o senhor do Olimpo quebrar regras que ele mesmo criou.

Odin apenas bufou e fez um gesto de descaso com a mão direita.

Mais ou menos uns dez metros abaixo de onde estavam, ouviu-se um arrastar de corrente e um rugido gutural. Todos viraram naquela direção, que era para onde Zeus olhava. Chegando perto deles, estavam Poseidon e Hades, irmãos de Zeus, segurando um monstro acorrentado. Era igualzinho às descrições de Zeus.
- Pelas asas de Isís... - disse Hórus.

O cheiro era horrível, uma mistura de ácido, enchofre e pudim apodrecido. A presença que a criatura irradiava era malévola e destruidora.  

- Sem dúvida alguma, uma criatura do Caos - disse Odin.

- Mas eu nunca vi algo assim antes. Nem no Egito, nem nas profundezes do Duat. Isso parece... irradia poder como...

- Apófis. – Respondeu Zeus. Apenas pronunciar o nome da serpente trazia calafrios aos deuses. - Tiamat e Iormungard. Sim, a criatura fede como o Círculo da Serpente.

Ao ouvir o nome das serpentes, a criatura abriu os olhos, negros como carvão. Sua boca pingava um liquido podre, negro, mas abriu-se em um hediondo sorrizo. Hades mandou uma energia negra para o monstro, que urrou de dor.

- Conte a eles - disse Hades - conte a eles o que nos disse.

- Shirripnos magos letenes apoiófricos. Nosteras destemos lindigras blog bleggeur.

A voz era reptiliana, com certeza. Mas o idioma, era algo nunca pronunciado na terra.

- O que esse bicho está falando? – perguntou Odin.

- A lingua antiga de Isfet – disse Hórus –, a linguagem do Lord Primordial do Caos.

Desta vez, Poseidon e Hades atacaram a criatura com energia. O animal (se pode ser chamado assim), urrou novamente, pondo-se de joelhos.

- Na nossa língua monstro. – disse Poseidon.

- Sssssssssserto. – disse o monstro. – Falarei na ssssssua língua, deus dos maresssssssss.

Todos se olharam surpresos. Como podia a criatura saber que Poseidon era rei dos mares? Como se pudesse ler as expressões dos deuses, a criatura, com um sorriso hediondo, voltou a falar:

- Eu disssssssssse, que os diassss de pazzzzz e ordem essstão acabadossss para a terra. Vocêsssssssss devem aproveitar bem osssss últimossss diassss de seussss reinadossss. O Conquistador essssstá vindo.

- Quem é o Conquissssstador? – inquiriu Hórus – Apófis?

- Há, há – riu o monstro – A Triade da serpente não é nada perto do Conquissssstador. O conquissssstador é muito mais poderosssso.

Os três reis deuses se calaram. Na última batalha do Egito, se não fosse os reforços dos olimpianos e asgardianos, Apófis teria destruído os deuses do Egito. Se os três lordes da Triade da Serpente atacassem juntos, o Egito poderia nem mais existir. Se esse Conquistador era realmente mais poderoso que os três lordes juntos...

- Sssssssssim – disse o monstro – temam. Temam o poder do Conquissssstador. Ele já desssstruiu galáxiassss inteirasssss. Vocêsssss não tem a menor chance.

- Qual seu nome, criatura? – perguntou Odin.

- Na sssssua língua, Pai de todossssss, sssssou chamado Sssserpenterra. Fui um dossss primeirosssss a chegar aqui, no seu planetinha.

- E o que você é, um comandante também? – perguntou Hórus.

- Não, não, Vingador. No meu mundo, sssssou o que vocês chamariam de deusssss menor da terra.

Todos se calaram, analisando a criatura. Se fora preciso dois dos deuses mais poderosos do olimpo para manter essa criatura sobre controle e ele era apenas um deus menor no seu mundo, o perigo que corriam era maior do que imaginavam

- Meus irmãos, - disse Zeus – agradeço pela ajuda. Podem ir, tranque-o com os outros.

Poseidon e Hades fizeram uma pequena mesura para os reis, dentro do que suas posições segurando a criatura permitiam e se foram, desaparecendo em nuvens de fumaça negra e verde, levando consigo o Serpenterra.

- Hórus, Odin, – disse Zeus – essa criatura está fraca agora. Foi preciso todo o poder dos deuses do Olimpo para derotar cinqüenta deles. Segundo informações que conseguimos tirar dele e de outros seres, eles invadirão a terra com milhares de seres, e muitos deles são muito mais poderosos que eles.

"Antes de continuarmos, gostaria de saber onde podemos manter esses monstros. Por enquanto eles estão no Tártaro, mas como esse é um assunto que envolve todo o planeta, creio que cada um de nossos reinos deve ter pelo menos alguns desses bichos para conseguir informações referentes ao seu próprio povo. Concordam?"

Os deuses assentiram. Zeus podia ver a preocupação e o medo nos olhos deles. Mas eles não demonstravam. Jamais demonstrariam. Eram líderes. E líderes devem aparentar confiança sempre. Principalmente quando não sabem o que fazer.

- Acho então, - disse Odin – que está na hora de convocarmos o conclave, meus amigos.

- Sim, - disse Hórus – mais que na hora. O conselho primordial deve ser avisado. Temos muito para decidir.

Zeus olhou para o céu. Milênios de paz, desde a primeira guerra que envolveu os reinos mortais e imortais na mais sangrenta batalha. Agora, estava acontecendo outra vez. Só que pior. Agora todos estavam ameaçados. Deuses, mortais, demônios, anjos, animais sagrados, titãs... todos os seres da terra corriam perigo.

E o piro é que essa guerra se estenderia até Ethérion, mundo natal dos imortais, que está conectado à terra, como se fosse outra camada desta existência. O rei do Olimpo sabia que chegaria o momento em que os guerreiros da ordem e do caos teriam que trabalhar lado a lado para proteger seu mundo, mas será que seriam capazes disso? Conseguiriam por de lado as diferenças e trabalhar por um objetivo em comum?

Depois da última batalha batalha contra a Triade da Serpente e o pacto de paz, Zeus achou que as previsões sobre o fim do mundo estavam equivocadas, ou no mínimo muito distantes. Apófis e Iormungard não engoliriam Rá e Odin, e Tiamat não lideraria os titãs e gigas contra ele e seus filhos no Olimpo. 

Era muito pior. O que ameaçava a terra, se as informações de Serpenterra e seus aliados fossem verdadeiras, era algo que fugia do conhecimento até de Odin, o mais sabio entre os reis deuses. Zeus só esperava que o conselho primordial tivesse alguma idéia sobre o perigo que se aproximava.

Os dois reis também olhavam para o céu. Hórus, muito jovem, mas ousado e determinado. Legitimo governante do Duat, seres de maior controle na magia de guerra entre todos os etherianos. Odin, o mais velho e sabio rei deus. Conquistou tamanha confiança e amor dos asgardianos, como não havia em nenhum outro reino. 

Eles, juntamente com Zeus, o mais poderoso rei deus, eram os lideres dos três maiores reinos de Ethérion. Eram os líderes do Império Ômega, governando vários reinos além dos seus. Apesar das diferenças de opiniões e desavenças passadas, teriam que se juntar e batalhar lado a lado.

Aos poucos, cresceu dentro deles a determinação do que iriam enfrentar. E eles lutariam. Lutariam e fariam de tudo para vencer. 

Os três reis deuses se olharam e chegaram a um acordo silencioso.

- Bem senhores, - disse o rei do Olimpo – está na hora dos preparativos para o Ragnarok. A última batalha pela vida na Terra e em Ethérion está em nossas portas.

Nenhum comentário:

Postar um comentário