segunda-feira, 21 de outubro de 2013

A Filha do Tempo - Capítulo 2 - Em casa | Parte 3

Para ler a parte 1 deste capítulo de A Filha do tempo clique aqui. Para ler a parte 2, clique aqui.

 

Acordei com a Pri gritando na minha orelha e me sacudindo.

- Déeeeeeeeeeeeeeee! Déeeeeeeeeeeee!

- Ah!!!!! Sai de cima de mim, sua louca!

Ela riu que nem doida e continuou me sacudindo. Enquanto não sentei e joguei meu travesseiro na cara dela, sinal de que estava bem acordada, ela não parou.


- Que que você ta fazendo aqui essa hora? Por que não ta na escola?


Ela olhou pra mim com cara de “dã” e apontou pro seu relógio de pulso com o indicador.


- Que horas você pensa que é? São cinco e meia.


Olhei pra ela assustada e peguei meu celular em baixo do travesseiro. A magrela tava certa, eram mesmo cinco e meia. Eu passei o dia inteiro dormindo.


- Eu...


- Você dormiu o dia inteiro, bem. Mas esquenta não. O pai disse que tentou te acordar, mas você não abria os olhos nem com reza brava, então, achou melhor você dormir pra ver se acordava melhor.


Eu me espreguicei, dando um baita bocejo. Ainda estava com a roupa que fui no médico.


- Bom – eu disse, - vamos tomar café?


Ela me olhou com cara de quem tava aprontando alguma. Conheço minha irmã. Fiquei um tempo esperando ela me dizer alguma coisa. Como não disse nada, e ficava com aquela cara de pamonha, não agüentei. Sou super curiosa.
- Tá, tá! Fala logo. O que foi?


- Acho melhor você ir lavar o rosto.


- Por quê?


- Por que acho que você não vai querer encontrar o Rod assim, com a cara toda achatada.


Senti meus olhos se arregalando e minha boca abrindo. Parecia que meu peito ia explodir. Não... O Rod não podia estar...


- Lá embaixo - disse a Pri, como se lesse minha mente, - com o pai. Se eu fosse você, não deixava ele muito tempo esperando... Foi maior difícil convencer ele a vir, e se você não descer, ele pode ir embora e...


Antes que ela terminasse, joguei meu último travesseiro do estoque na cara dela e corri pro banheiro. Precisava passar pelo menos um creme anti-olheira e um lápis no olho. Será que dava tempo de passar um blush?


- Deb!


Ai droga, era o meu pai gritando lá de baixo. Isso significava que a paciência dele tava acabando. Ele odeia ficar fazendo sala pros nossos amigos, principalmente quando era um menino amigo da Pri, ou meu. Mais principalmente ainda quando era o Rod.


Não que ele não gostasse do Rod, mas meu acho que meu pai conseguia entender o que eu sentia pelo cego do garoto bem mais do que ele. O Rod é... desligado, quando o assunto é relacionamento entre um menino e uma menina. E eu não ia ficar me fazendo de fácil por causa dele. Até porque, eu achava que ele também gostava de mim. Mas sinceramente, como era tapadinho.


- Deb! O menino ta esperando!


- Já vou!


Como meu pai era delicado...


Acabei passando só o creme anti olheira e o rímel. Escovei os dentes, pentei o cabelo e desci. A Pri já estava na cozinha, matracando sem parar com meu pai. Com certeza, tava tentando fazer com que meu pai deixasse a gente um pouco mais a vontade, coisa que ele não era muito a favor de fazer.


Quando eu desci,ele me olhou de cara feia e continuou conversando com a Pri. Se bem que não era uma conversa, estava mais para um monólogo.


- Oi Deb.


Virei na direção da sala e ele estava lá, em pé, me esperando.


- Oi Rod, tudo bem?


- Comigo? Sim, está tudo bem. Quero saber como você está, senhorita.


O Rod é um cara muito, mas muito legal. Ele é moreno, bem moreninho mesmo. Tem a cabeça raspada e lindos olhos negros. É praticamente da minha altura, um metro e sessenta, acho. Estava vestido com sua camiseta dos Thundercats preta(ele adora esses negócios de desenhos animados e hq’s), calça jeans preta e tênis preto (é, eu sei, ele praticamente só tem roupa preta). Nas mãos estava seu Iphone. Com certeza, ou ele estava lendo um livro (ele adora ler, tempo todo) ou jogando MAA (Marvel Avengers Alliance, jogo online dos Vingadores. Até comecei a jogar por causa dele, e acabei viciando).


- Senta ai – eu disse pra ele, sentando no outro sofá. Não ia arriscar o sr. Machado dando chilique, né?


Ele sentou, e ficou me olhando, com um sorriso nos lábios. Até que seu sorriso desapareceu.


- Deb... sério. Você tá legal? Fiquei super preocupado ontem. Tentei ficar lá, entrar na enfermaria, mas a Angélica me disse pra ir pra casa. E depois – ele disse abaixando o tom e olhando desconfiado pra cozinha, - eu não sabia se seu pai ia gostar de me ver lá. Acho que ele não vai muito com a minha cara, sei lá porque.


Eu tive que segurar pra não rir na cara dele, porque ele era o único ser no mundo que não sabia porque meu pai não gostava dele.


- Bobagem – eu disse. Estava na hora de mudar de assunto. – Agora eu estou bem. Só um pouco confusa ainda, mas vai passar. Não entendi muito bem o que aconteceu, mas, agora acho que to bem.


Não queria tocar no assunto da Bia, que a Angélica afirmou não existir. Eu tinha te me esquecido de comentar isso com a Pri, mas não ia dar mancada para o Rod me achar doida. No final, ele facilitou minha vida.


- Olha Deb.... Eu vim aqui te ver, por que estava preocupado com você – ele sorriu, meio sem graça, o que eu amei. – Mas também tem outro assunto que gostaria de tratar com você, antes que eu acabe ficando louco.


Meu coração acelerou. Será que ele ia... Não, não ia. Pela cara dele, ele estava falando de algo mais complicado (infelizmente). Parecia que ele estava realmente com medo de alguma coisa.


- Pode falar Rod. Seu eu puder te ajudar de alguma maneira...


Ele respirou fundo, antes de dizer.


- Todos na escola afirmam que você caiu e bateu a cabeça na sala de aula, na aula de química do professor Tiburço.


Ele esperou para que eu pensasse no que ele tinha dito.


- Certo.


- Então – continuou, - eu não quis falar nada a respeito porque não queria parecer idiota, mas...


- Fala logo.


- Eu não lembro disso acontecendo.


Eu olhei pra ele por alguns instantes. Será que ele...


- Eu me lembro – ele recomeçou, antes que perdesse a coragem – de você sendo chamada pelo sr. João e indo pra diretoria, não pra falar com a tal de Dulcinéia que ta todo mundo afirmando ser a diretora e tratando como se ela estivesse lá desde o começo do ano. Quem chamou você foi a Bia, que sempre foi a diretora da escola, pelo menos na minha cabeça. Então Deb, por favor, alguma coisa do que eu disse faz sentido pra você?


Estava sem fala. Tentei esconder o dia inteiro que a história da Angélica não fazia sentido, e me vem o Rod e fala que também lembra das coisas exatamente como eu.


- Rod...


- Por favor, Deb. Se estou ficando louco é só dizer.


Respirei fundo, e quando ia contar pra ele, minha mãe entrou em casa pela porta da sala.


- Filha.


Ela veio em minha direção e me abraçou forte. Só então notou o Rod no outro sofá. Ela sorriu pra ele e depois piscou pra mim, no que ela achou ser uma atitude bem discreta, que infelizmente o Rod viu. Ele não tinha onde enfiar a cara, nem eu.


- Rod, que bom ver você aqui.


- Boa noite, dona Ruth. Como vai a senhora?


- Vou bem, graças a Deus. Fica pra janta?


- Bem, acho...


- Ruth! Demorou pra chegar.


Meu pai entrava na sala, com a Pri, o André e a Carol atrás. Minhas irmãs estavam cochichando e rindo, enquanto meu pai e o André estavam estufando o peito, numa típica atitude de machos dominantes da manada. Eu queria entrar dentro de uma caixinha de fósforo e explodir.


- Ora amor – disse minha mãe, rindo da cena, que estava patética, - passei no mercado pra comprar mistura. Você sabe que eu sempre passo no mercado depois do serviço.


- Humpf... Agora terei que ir trabalhar de carro.


Na verdade, meu pai já devia ter ido faz uma meia hora. Mas pelo que conheço dele, estava esperando o Rod ir embora ou minha mãe chegar. Ele se contentaria mais com a primeira opção, mas a segunda já dava pro gasto.


- Estou indo então – deu uma olhada pro Rod. – Quer uma carona pra casa? Vou passar lá perto, pra deixar o André no curso de informática.


Antes que o Rod pudesse abrir a boca e dizer que morava dois quarteirões acima da nossa casa e que não precisasse de carona, minha mãe salvou a noite.


- Gentileza sua, querido. Mas eu convidei o Rod pra jantar conosco. Já até mandei uma mensagem de texto pro celular da Helena avisando. Podem ir amores – disse, dando um beijo de despedida no meu pai e no André. – André, depois do curso de volta pra casa.


- Ah! Mãe, qualé!


- Sem qualé! Acabando o curso, direto pra casa.


Meu irmão saiu resmungando. Minhas irmãs e eu beijamos meu pai, nos despedindo. Ele olhou de cara feia para o Rod outra vez, que acenou com a mão um tchau e foi embora. Assim que o carro saiu, minha mãe chamou a Pri pra ajudá-la com a janta.


Infelizmente, a Carol ficou, e não dava pra continuarmos a conversa. Ela pediu pro Rod brincar com ela de boneca, e ele aceitou prontamente. Fiquei ali, rindo enquanto ele era o Kent, que tinha que pedir a Barbie em casamento.


- Eu vou ver se minha mãe precisa de ajuda.


- Tudo bem – dele disse sorrindo. – Enquanto isso, vou construir uma casa aqui e...


- A casa já vem pronta – cortou a Carol, e o Rod ficou com cara de tchongo. - Você tem certeza que nunca ouviu falar da cidade da Barbie? É o melhor brinquedo do mundo e...


A Carolzinha é terrível. Agora que ela tinha pego alguém com disposição para ouvir,com certeza ela iria contar ao Rod toda a história da Cidade da Barbie. Olhei para ele, que estava com cara de “não estou entendendo nada”. Eu ri e fui pra cozinha. Como a Pri tava lavando a louça, fui ajudar minha mãe a cortar os legumes.


Ela olhou pra mim, sorriu e deu uma esticada no pescoço pra ver o Rod e a Carol brincando.


- Sabe filha, é preciso ser muito homem pra brincar de casinha com uma menina.


- Eu também acho, mãe – disse retribuindo o sorriso.


- Ele é um menino – continuou minha mãe. – Vai ser um pai cuidadoso. Da pra ver só pelo jeito que ele trata a Carolzinha.


Fiquei olhando para os dois brincando na sala. A Carol tava imitando minha mãe, quando ela fica brava com meu pai, porque o Rod não tinha comprado alguma coisa que ela queria, no mercado de mentirinha. Ele ria a bessa, e pensei que talvez fosse hora de parar de dar uma de difícil.


- Ele será um bom namorado – disse minha mãe, olhando para os legumes que estava cortando.


Olhei outra vez pra ele, e quase falei pra minha mãe que eu não tinha duvida disso.

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